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  • Foto do escritorAndré Silveira

A Oportunidade

Esta coisa de partidos, que nunca gostaram muito de celebrar o 25 de Abril usarem a desculpa da Covid-19 para não o fazerem, cheira um bocadinho a mofo. Sendo que não faz qualquer sentido ajuntamentos de pessoas a esta altura, parece-me um não assunto. É apenas politiquice, bolorenta ainda por cima, para não falar que é focar a atenção em algo com uma importância relativa. À boa maneira nossa, centramo-nos em "tolices", em vez de em o que é realmente fundamental e premente. Daqui em diante importa pensar o futuro e recuperar o país e a região, e isso sim é importante. Essa será a missão mais importante desta geração nesta primeira metade do século nos Açores, em Portugal e na Europa.

Esta é a oportunidade para repensar a base da economia dos Açores. Se o processo será traumático o suficiente, também nunca houve, nas últimas décadas, oportunidade como esta para se repensar e recomeçar. Essa é uma das vantagens de uma paragem tão abrangente da economia. Em Março e Abril uma economia já totalmente dependente do Estado, como a dos Açores, viveu, e viverá por bastante tempo, apenas do Estado.

Importa começar a traçar a linhas estratégicas para a economia pós 2020. Esse é o trabalho essencial e urgente que se pede à classe política nos tempos mais próximos. Nada será mais importante, nem terá tanto impacto na vida dos Açorianos nas próximas décadas.

A oportunidade de repensar o turismo

Olhe-se, seja de que ângulo for para o futuro dos Açores, é pacífico dizer-se que a principal atividade económica, capaz de gerar riqueza, com capacidade de exportar e capaz de ser um pilar da economia regional, será o turismo. Sendo que é também claro que o setor irá atravessar uma longa recuperação, que poderá durar anos. Esta é a oportunidade para se refletir no passado recente e preparar o futuro. É óbvio agora que o modelo de desenvolvimento terá de ser muito diferente de ilha para ilha, por exemplo. Mesmo a questão da forte preponderância de alojamento local é assunto que merece uma abordagem de regulação e gestão, mas sem cair no erro de criar restrições que impeçam uma verdadeira recuperação no futuro. A marca "Açores destino de natureza" tem de passar de ser uma promessa para uma realidade. Não basta parecermos, teremos de o ser, e tal exige um pensamento transversal de conservação e proteção dos nossos ativos ambientais em terra e no mar.

A oportunidade de apostar na "Green Recovery"

Poder recomeçar é a oportunidade de fazer diferente e melhor. Esta é também a oportunidade de o mundo retomar a economia com uma verdadeira consciência ambiental, e capitalizando a redução de emissões de gazes de estufa que se está a verificar com a paragem abrupta de muitas atividades económicas. Assim também deverá ser nos Açores. Apostar nas economias verdes e azuis pode ser um fator de verdadeira criação de riqueza e de emprego. Assim será a nível global, e os Açores podem ter uma vantagem competitiva real, muito em especial no que diz respeito ao mar pela sua localização geográfica. O vetor recuperação verde deverá ser introduzido de modo a potenciar a sua execução aproveitando a reestruturação da economia. Os movimentos internacionais com o mesmo objetivo, como a Green Recovery Alliance , mostram que será um tendência importante que teremos de ter em conta como uma oportunidade decisiva.

A oportunidade de repensar a pesca

A pesca faz parte da identidade dos Açores e das suas gentes. No entanto, a sua sustentabilidade, bem como o modelo económico em que está assente, reconhecidamente não respondem a diversas ansiedades sociais e ambientais dos tempos modernos. O modelo de subsistência de miséria em que muitos pescadores se encontram, não pode ser o futuro. Do mesmo modo, em termos ambientais, a destruição de ativos naturais não pode continuar de modo sistemático. Esta paragem também é oportunidade de repensar o sector, reduzido o esforço de pesca, pescando menos, mas com mais Valor. Não se pode correr risco de deixar que a pesca seja o "escape" da onda de desemprego que será expectável, como foi no passado com resultados calamitosos em termos sociais e ambientais. Houvesse coragem para isso.

A oportunidade de repensar o ensino

A atual discussão sobre que transformações terão de haver no ensino em resposta ao confinamento temporário de alunos e professores, está sendo já uma importante reflexão acerca do que será o futuro da escola. Esta fase terá de ser vista como uma oportunidade para combater a infoexclusão e as deficiências de competências em TIC's. Será um processo razoavelmente doloroso, mas que no final levará a uma maior preparação para o futuro de alunos e professores. O futuro da formação fora da escola é online. Aliás, em alguns sectores já só há formação online, preparar esta geração para essa realidade faz todo o sentido.

A oportunidade de repensar a agricultura

A era do leite acabou nos Açores. Já era evidente antes desta crise, e será cada vez mais uma realidade no futuro. O falhanço de todo o sector, começando pela governação, terá um impacto tremendo e imprevisível. Os sinais de declínio do leite são consistentes há já muito tempo, sendo que o golpe decisivo aconteceu com o final do sistema de quotas, que pressionou o preço para valores insustentáveis apesar de híper subsidiação transversal de toda a atividade. Será uma fantasia pensar que os Açores deixarão de ser um player importante na produção de leite, mas o caminho terá de ser muito diferente. A aposta na transformação fugindo de produtos de baixo valor dependentes da grande distribuição, é o único caminho. Não se entende como não existe uma verdadeira aposta em produtos de alto valor acrescentado, como o queijo, como base da recuperação da produção e aproveitando a excelente matéria prima regional, entre outros exemplos de produtos lácteos.

Produzir o que importamos é já uma tendência global, e que deverá ser abraçada também por cá, começando pelas produções tradicionais, e pelas que tecnicamente já deram provas de serem possíveis. Estudar e explorar outras opções terá de ser um trabalho contínuo e fundamental para a diversificação. Um programa de verdadeira refundação da agricultura regional é urgente, pensando-se o que faz sentido cultivar para consumo local e o que faz sentido produzir para exportação, sendo que estes últimos terão de ser produtos com verdadeiras vantagens competitivas no mercado externo, e sem cair na tentação da híper subsidiação criando efeitos perversos que se pagarão caro no futuro. Aprender com o passado sem repetir os erros, do leite por exemplo, deverá ser a missão fundamental dos governantes neste e em todos os restantes sectores.

No final podemos acabar melhor do que quando começámos.

André Silveira

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