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  • Foto do escritorAndré Silveira

O Mar no programa do XIII Governo Regional dos Açores

O mar dos Açores cobre mais de 95% do seu território (é mais, eu sei, não fiz as contas, por isso não me chateiem). A definição do ser ilhéu, e a sua muralha de confinamento, tem tido porém muito pouca atenção. As últimas décadas são um tratado acerca de como um povo, que quer se autodeterminar, nunca mostrou condições para tal, dando todos os argumentos aos verdadeiros centralistas. Não nos sabemos governar, mas queremos essa prerrogativa. Sei que esse contra-senso se aplicará a muitos mais temas da nossa Autonomia, mas não há outro mais importante. Se os Açores têm dimensão atlântica, e a dão à República, tal deve-se ao nosso mar e à enorme ZEE que resulta da nossa condição insular no meio do Atlântico.


Foi por isso com entusiasmo que li com atenção o recentemente divulgado programa do XIII Governo Regional dos Açores, até porque participei com um pequeno contributo na escrita da proposta temática sobre o assunto que deu origem ao programa eleitoral do PSD. O misto entre entusiasmo e preocupação rapidamente degenerou em estupefacção. Não tem lá nada sobre o Mar, pelo menos de uma forma integrada como afirma o conceito de Economia Azul. Bem, vamos ser justos, até tem. Tem uma meia dúzia de ideias absolutamente genéricas, e bastante Pesca, o que tem sido o paradigma há mais de 20 anos. Portanto, se alguém espera mudanças acerca do modo como a governação vê o mar nos Açores, enganam-se, não vai acontecer. Enquanto não se olhar para Economia Azul de modo holístico centrada nos princípios emergentes, por exemplo os preconizados pela Comunidade Europeia, vamos continuar a marcar passo.


O programa fala do mar em duas perspectivas, um capítulo sobre Mar, que na verdade é sobre Pescas, mais alguns parágrafos de generalidades sobre conservação, e um capítulo sobre Ambiente, com algumas referências secundárias, mas com um enorme cuidado para não entrar pela "jurisdição" alheia. Aliás, quer me parecer, que este pobríssimo programa neste tema resulta da necessidade de acomodar os interesses da coligação, e em especial, da opção de separar o Mar do Ambiente. O que teremos na prática será uma secretaria que tomará conta do Ambiente com o Mar absolutamente secundarizado, e teremos uma secretaria que na prática será das "Pescas". Uma enorme asneira, e até, um retrocesso em potencial. Quem já lidou com governos, sabem bem o quanto é difícil a coordenação entre tutelas. Nos Açores, com partidos diferentes em secretarias diferentes, é basicamente impossível. Ver o mar apenas como, ou fundamentalmente como Pescas é a afirmação da continuidade do paradigma que nos trouxe até ao grave declínio dos stocks, muito em particular nas zonas costeiras nos Açores, que se apresenta como o principal factor de declínio para todo o sector.


Falta quase tudo no programa. Mas o mais preocupante nem é o que falta, é o que lá está e é absoluta asneira. Apenas um exemplo: insistir na "Pesca Turismo" é uma asneira colossal e que demonstra algo que é deveras revelador de como as coisas irão funcionar no futuro: Não sabem de Pescas nem sabem de Turismo. Outra asneira preocupante é, de novo, insistirem na valorização de espécies com baixo valor comercial. Podem deixar os peixes em paz, por favor? Quando em todo o mundo se está a fazer um esforço concertado para reduzir o esforço de pesca, nos Açores ainda se exploram maneiras de o aumentar, aliás, acerca de redução do esforço de pesca, ou de reconversão de profissionais da pesca, nem uma palavra.


Resumindo, é um "não programa". Tem pouco, e do pouco que tem, tem asneiras. É apenas uma continuação "light" das políticas anteriores, até porque o PS sempre teve bons programas sobre o mar. Nunca os implementou, o que é diferente, mas não se pode dizer que não tivesse uma ideia para o Mar dos Açores. Se recuarmos mais de 8 anos iremos encontrar um documento, aprovado na ALRA como de interesse regional, sobre pescas onde está (quase) tudo (também com algumas asneiras). Está aqui. Como em muitas outras coisas, nunca houve coragem para tomar as decisões difíceis, a imagem de marca da governação do PS/A. Fica o conselho ao Sr. Secretário do Mar para uma leitura atenta. Muito do que lá está é ainda bem actual.


Como pessoa interessada pelo assunto, que estuda e escreve sobre o Mar há mais de 15 anos, e principalmente como Açoriano, espero sinceramente que a governação seja várias vezes melhor do que o programa, porque com este documento, não vamos lá.


André Silveira


P.s O Mar também vem referido no capítulo da Ciência, mas aí, sei que o assunto está muito bem entregue, e que havendo dinheiro, o sucesso está garantido.






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